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“Cenas como essa se repetem no Brasil todos os dias”, diz cientista social sobre busca de comida no lixo

23/10/2021 09h09
“Cenas como essa se repetem no Brasil todos os dias”, diz cientista social sobre busca de comida no lixo
. - Foto: REPRODUÇÃO

No último domingo (17), foi divulgado um vídeo nas redes sociais onde pessoas em situação de vulnerabilidade esperam um caminhão de lixo para procurar e coletar restos de alimentos. O caso foi registrado por um motorista de aplicativo em frente a um supermercado no bairro Cocó, área nobre de Fortaleza.

Esse caso acendeu um alerta sobre a fome e insegurança alimentar no Brasil. O cientista social e professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Vagner Gomes Bijagó, é o entrevistado do Cada Minuto deste sábado (23). Segundo ele, houve um agravamento da fome no país desde o início da pandemia da Covid-19 devido a maior vulnerabilidade para trabalhares informais.

Confira a entrevista abaixo:

Como avalia o vídeo que mostra moradores procurando comida em caminhão de lixo em Fortaleza?


O vídeo reflete a ponta do iceberg de uma realidade muito mais profunda. Se a gente perceber a questão da pobreza no Brasil sempre foi acentuada, e a pandemia reforça essa perspectiva. O aparecimento de cenas onde as pessoas aparecem catando ossos no caminhão é tão somente um sintoma dessa realidade.

Cenas como essa passaram a ser mais corriqueiras depois do início da pandemia?


A pandemia exacerbou essa questão, uma vez que as pessoas de baixa renda trabalhavam lateralmente no comércio informal. Com o fechamento parcial dos estabelecimentos, essas pessoas passaram a não ter onde buscar seu sustento, agravando muito mais a situação de segurança alimentar dessas pessoas.

De quais formas a imagem do grupo procurando alimentos dentro de um caminhão de lixo impacta a sociedade?

Essa questão do impacto na sociedade mostra um problema sociológico. Talvez nos tempos atuais essa cena chocaria mais, até a sociedade poderia se mobilizar para uma pressão, uma manifestação, e até mesmo saques, quebras. Cobrar aos Estado para que se tenha uma política pública efetiva para essa situação, mas muitas vezes o que observamos é que a própria vítima se culpa e isso é um sintoma de que o neoliberalismo deu certo.

A realidade do vídeo é vista em outros locais do país tendo em vista que cenas como essa não são divulgadas diariamente?

Acredito que essa realidade acontece em maior grau em todo o país, se observarmos é muito comum percebemos pessoas de situação de vulnerabilidade econômica catando comida no lixo. O que aconteceu no Ceará ganhou a mídia e ganhou essa ‘espectualização’, o mundo do espetáculo, mas isso acontece todos os dias nas periferias do país. Nós podemos fazer um paralelo das questões também no chamado ‘genocídio da população negra’, que acontece todos os dias, mas quando um caso ganha a mídia acaba tendo uma repercussão muito maior. Cenas como essa se repetem no Brasil todos os dias.

Como avalia a situação do estado de Alagoas com relação à extrema pobreza em Alagoas?

A sociedade alagoana que é muito conservadora, se a gente olhar o modelo econômico do estado de Alagoas tem um resquício da questão colonial ainda muito forte, com a concentração de renda muito forte. Esse espírito também que o neoliberalismo acabou imprimindo, esse processo de individualização, onde quem não tem absorve.

Os programas assistenciais tanto do Governo Federal e Governo Estadual podem ser considerados suficientes para atender a demanda?

O que nós vimos nessa situação pandêmica, onde a população de baixa renda foi mais impactada, é que esses programas se tornaram insuficientes. O que requereria do Estado um olhar mais atento, mais abrangente, um programa de maior amplitude que desse uma assistência a essas pessoas de situação de vulnerabilidade. O Estado deve olhar com atenção a questão da inclusão digital, porque o meio para acessar esses programas é através dos smartphones, de aplicativos, como a Caixa Econômica e talvez isso possa deixar muita gente de fora. Outra coisa também que vimos durante os programas, são pessoas que estão em uma faixa que não deveriam acessar o programa e conseguiram acessar. Isso demonstra a falta de empatia daqueles que não precisaram do programa.



Fonte: Cada Minuto

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